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Conheça as fases da Câmara Municipal de Lençóis Paulista em seus 159 anos de história

A história da nossa Câmara passou por quatro reformas históricas que conversam com a história do Brasil

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A trajetória das câmaras municipais no Brasil está profundamente entrelaçada com a própria história política do país. A cada mudança de regime, do Império à República, passando por períodos de centralização autoritária e redemocratização, transformações significativas atingiram a administração pública e os órgãos que a compõem.

A história da Câmara Municipal de Lençóis Paulista é um reflexo direto dessas mudanças institucionais. Já em sua quarta configuração formal desde a fundação, ela espelha, em âmbito local, os avanços, retrocessos e adaptações do poder legislativo brasileiro ao longo dos séculos.

Conheça um pouco de como se organizou a Câmara Municipal de Lençóis Paulista nos 159 anos de sua história!

 

PERÍODO IMPERIAL (1866-1889)

A primeira Câmara Municipal de Lençóis Paulista (na época chamada “Lençóes”) foi oficialmente instalada em 12 de julho de 1866, um ano após a elevação do povoado à categoria de vila, equivalente aos municípios atuais. A criação foi autorizada pela Lei Provincial nº 90, de 25 de abril de 1865.

Na época, as câmaras municipais eram regidas pelas determinações estipuladas pela Lei de 1º de outubro de 1828, que reorganizou o órgão seguindo a Constituição de 1824. As legislaturas duravam quatro anos e a presidência ficava a cargo do vereador mais votado.

Durante o Império, o órgão era responsável por arrecadar e gerir os impostos, cuidar da infraestrutura da cidade, dialogar com o governo da Província e eleger os juízes que resolviam os conflitos na cidade. Não havia Executivo e o Judiciário era embrionário, tudo recaindo sobre a Câmara.

As sessões eram realizadas em imóveis alugados, popularmente chamados de “Casa da Câmara”. Um dos primeiros locais em Lençóis foi a residência do Capitão Benjamim Dias Baptista, escolhida por oferecer condições mínimas para os trabalhos legislativos, “uma dúzia de cadeiras, uma mesa e duas alcovas pequenas”.

Os trabalhos aconteciam de acordo com as necessidades do município. No primeiro mês, por exemplo, a Câmara teve reuniões diárias do dia 14 ao dia 18 de julho, mas depois se reuniu apenas em 13 de setembro, em sessão extraordinária. Entre uma sessão e outra, quem trabalhava eram os funcionários da Câmara, como o Arruador, os Fiscais e o Porteiro.

 

Destaques

Acontecimentos notáveis desse período incluem o adiamento de muitas das sessões por falta de número legal. Os vereadores convocados não apareciam, e os que não apresentavam justificativas justas eram multados em dois mil reis cada um. O Vice-Presidente Antonio Alves Maciel, por exemplo, tomou posse mas não apareceu nas primeiras sessões da legislatura de 1883. Ele evitou uma altíssima multa justificando que não havia comparecido por ter um estrepe no pé que o impedia de andar.

A primeira Câmara teve 6 legislaturas e 64 vereadores. O sistema eleitoral era censitário, ou seja, apenas homens livres com certa renda anual podiam votar, e para se candidatar para vereador era preciso ser cidadão brasileiro (nato ou naturalizado) e ter renda mínima compatível.

 

Nomes importantes dessa época

  • Generoso Antonio de Oliveira
  • Miguel Augusto Rodrigues de Almeida
  • Estevão Correa de Moraes Bueno
  • Custódio José Vieira
  • Silvestre Correa de Moraes Bueno
  • João de Palma Carneiro Giraldes
  • Mamede Feliciano de Oliveira Rocha (da vila Mamedina)
  • David Manoel Lopes
  • Guilherme Rodrigues Duarte Ribas
  • Antonio Alves Maciel
  • Faustino Ribeiro da Silva
  • Cornelio Brantes Fresi da Rocha
  • José Modesto da Costa

 

***

 

REPÚBLICA VELHA (1889 - 1930)

No dia 7 de fevereiro de 1890, na Câmara, foi lido o ofício enviado pelo então “governador” do Estado de São Paulo, datado de 29 de janeiro “no qual comunica a esta Câmara que, por decreto dessa data, foi dissolvida [a câmara] e [nomeado] um conselho de intendência para exercer provisoriamente a administração deste município”. Em 15 de novembro de 1889, o Brasil havia passado por um golpe liderado por Deodoro da Fonseca que culminou na Proclamação da República e no fim do Império Brasileiro.

O Conselho de Intendência atuou de fevereiro de 1890 a agosto de 1892 e contou com a participação de cidadãos indicados pelas autoridades do Estado, o que incluiu também alguns dos homens que já haviam sido vereadores anteriormente.

O conselheiro mais famoso entre eles foi o vigário da cidade, Dom José Magnani, que além de comandar a paróquia também presidia os trabalhos do conselho.

 

Dom José Magnani posa para uma foto rodeado de crianças em uma cerimônia de 1ª comunhão.
ACERVO ALEXANDRE CHITTO - ARQUIVO HISTÓRICO MUNICIPAL, ESPAÇO CULTURAL “CIDADE DO LIVRO”.

 

Dom José Magnani era a principal autoridade eclesiástica do município e exercia considerável influência política. Naquela época, a Igreja Católica desempenhava um papel central na administração local: era responsável pelos registros de nascimento, batismo e casamento, pela gestão do cemitério e até pelo controle de terras. No entanto, esse cenário começava a se transformar com a recente separação entre Igreja e Estado, que visava redefinir os limites entre as esferas religiosa e civil.

Após dois anos de funcionamento do Conselho, que contou com a participação de 23 cidadãos lençoenses ao longo de suas diferentes formações, chegou o momento de reinstalar a Câmara Municipal. As primeiras eleições foram realizadas em 30 de agosto de 1892, desta vez sem a exigência de renda mínima, embora ainda excluíssem mulheres, analfabetos, mendigos e soldados rasos. Os trabalhos legislativos foram iniciados no mês seguinte.

A partir da República, o funcionamento das câmaras municipais passou a ser regulamentado pelos estados. Em São Paulo, as câmaras seguiam os princípios defendidos pelo Partido Republicano Paulista (PRP), que detinha o controle político estadual. As diretrizes estavam previstas na Constituição Paulista de 1891. Começou aqui a separação dos poderes, mesmo que lenta e acanhadamente. O judiciário já havia se emancipado nos anos anteriores, e a figura do “Intendente” agora compartilhava funções com os vereadores.

Os intendentes deram continuidade às funções anteriormente exercidas pelo Conselho de Intendência e, inicialmente, eram nomeados diretamente pelo governador do Estado. Em Lençóis Paulista, o primeiro intendente escolhido pelos próprios vereadores da Câmara Municipal foi o Major Octaviano Martins Brizola, que integrava as atividades legislativas e participava das sessões como membro do colegiado. Pouco tempo depois, esse cargo evoluiria e passaria a ser oficialmente denominado “Prefeito”.

 

Destaques

Acontecimentos notáveis desse período incluem a realização de uma sessão magna para comemorar a instalação de energia elétrica na cidade (04/06/1910), a morte do primeiro cidadão a ocupar o cargo de “Prefeito”, Coronel Virgílio Rocha (13/12/1916); e uma eleição cancelada já com a legislatura em andamento, que renovou completamente os vereadores apenas 4 meses depois de começarem (1926).

Esta segunda fase da Câmara Municipal de Lençóis teve 13 legislaturas e 77 vereadores. A época foi marcada pelo controle estadual e oligárquico da política local e pela grande vulnerabilidade do processo eleitoral, que acabava manipulada pelas elites agrárias. Mulheres e pessoas analfabetas não podiam votar, e os pobres e trabalhadores rurais eram controlados pelos coronéis.

 

Nomes importantes do período

  • Eliseu Elysio de Almeida Cardia
  • Guilherme Ribas Junior
  • Antonio Fiuza Florencio do Amaral
  • José Candido da Silveira Correa
  • Benedicto Ottoni de Almeida Cardia (viria a fundar a cidade de Agudos)
  • Candido Alvin da Palma
  • Francisco Augusto Pereira
  • Virgilio de Oliveira Rocha
  • Elias Francisco do Prado
  • Lucio de Oliveira Lima
  • Elias de Oliveira Rocha
  • Agricio Canuto da Bôa Viagem
  • Octavio Pereira
  • Chitto Mauro
  • Alexandre Canova
  • Humberto Alves Tocci
  • Joaquim Anselmo Martins
  • Raul Gonçalves de Oliveira
  • Bruno Brega
  • Gino Augusto Antonio Bosi

 

***

 

ERA VARGAS (1930-1937)

Com a Revolução de Outubro de 1930 e o consequente golpe de Estado, foram dissolvidas novamente as câmaras municipais em todo o Brasil (Decreto nº 19.398/1930). Em Lençóis, o governo federal nomeou como interventor o Major Álvaro Martins, que passou a comandar a administração local.

Diferentemente do antigo Conselho de Intendência, criado na Primeira República como órgão provisório de governo municipal, instituiu-se agora um Conselho Consultivo, com função meramente auxiliar, sem poderes deliberativos, composto por cidadãos indicados para colaborar com a nova gestão.

Esse Conselho Consultivo teve duas formações distintas: a primeira entre 1932 e 1935, e a segunda de 1935 a 1936. Embora alguns antigos vereadores tenham sido chamados a compô-lo, a maioria dos conselheiros era formada por nomes novos, sem experiência anterior no legislativo local. Ao todo, o conselho teve 8 interventores e 9 membros nos seus 4 anos de existência.

No dia 22 de julho de 1936, é reinstalada a Câmara Municipal de Lençóis pelo então Juiz de Direito José de Castro Rosa, mas ela teria vida curta. Pouco mais de um ano depois, Getúlio Vargas instalaria um regime ditatorial no Brasil que fecharia as câmaras novamente. A última sessão registrada nos livros de atas aconteceu no dia 10 de novembro de 1937.

 

Destaques

Fizeram parte dessa formação efêmera, alguns cidadãos importantes, como Antonio Leão Tocci¹ (Presidente), Jacomo Nicolau Paccola² (Secretário), Gino Augusto Antonio Bosi³, Joaquim Anselmo Martins, Lucio de Oliveira Lima, Raul Gonçalves de Oliveira e Antonio Segala. O professor João Baptista Vianna Nogueira foi eleito, mas recusou tomar posse por ter cargo no magistério. Ele foi diretor do Grupo Escolar “Esperança de Oliveira”. No total, foram 15 vereadores.

 

 

***

 

PERÍODO ATUAL (1948-HOJE)

Com a queda de Getúlio Vargas em 29 de outubro de 1945, uma pretensa “redemocratização” do Brasil entrou em curso, e com ela, a restituição das câmaras municipais. Marcando o retorno da autonomia municipal após anos de centralização política, a Constituição de 1946 garantiu a autonomia municipal e a eleição direta de vereadores.

A estrutura das câmaras municipais consolidou-se, por fim, no modelo que conhecemos atualmente, com foco em funções legislativas e de fiscalização. Gradativamente, esses órgãos passaram a exercer maior autonomia frente ao Executivo local, ainda que nem sempre com plena independência política. São as legislaturas dessa encarnação do órgão que se enumeram na Câmara de Lençóis nos dias de hoje.

Essa é a fase mais duradoura da história das câmaras municipais no Brasil, marcada por profundas transformações e adaptações institucionais. Com o avanço da tecnologia e o abandono do voto em papel, as eleições tornaram-se progressivamente mais seguras e confiáveis. A obrigatoriedade do voto feminino, instituída em 1965, e a inclusão de pessoas analfabetas no processo eleitoral, em 1985, ampliaram significativamente a participação popular. Hoje, tanto o direito ao voto quanto a possibilidade de candidatura abrangem uma parcela muito mais representativa da sociedade brasileira. Em Lençóis Paulista, esse processo de inclusão teve um marco importante com a eleição de sua primeira vereadora, Lydia Bertoli Neto, em 1969.

 

 

Embora o Brasil tenha iniciado um processo de redemocratização após a queda de Getúlio Vargas em 1945, o novo regime manteve diversas práticas repressivas herdadas do Estado Novo. Militantes políticos acusados de “comunismo” continuaram a ser perseguidos, e a autonomia das administrações municipais permaneceu limitada, com forte controle sobre quem assumia cargos de liderança. Em Lençóis Paulista, um exemplo desse contexto foi a investigação do vereador César Giacomini pela Delegacia de Ordem Política e Social (Deops), órgão responsável por monitorar opositores do regime.

Durante a Ditadura Militar (1964–1985), diferentemente do que ocorreu sob o governo Vargas, as câmaras municipais permaneceram em funcionamento. No entanto, o regime impôs severas restrições ao poder legislativo, inclusive com a dissolução do Congresso Nacional em três ocasiões (1966, 1968 e 1977), o que refletiu também em instabilidade e repressão nos níveis estadual e municipal. Em Lençóis Paulista, o vereador Waldemar Geraldo da Motta chegou a ser preso por manter em sua residência livros considerados "subversivos" de orientação marxista.

O fim da Ditadura Militar e a promulgação da Constituição Federal de 1988 marcaram um avanço decisivo na redemocratização do Brasil, reconhecendo a autonomia dos municípios como entes federativos e fortalecendo as câmaras municipais. A partir de então, os vereadores passaram a ter papel mais claro e independente na elaboração de leis, fiscalização do Executivo e controle do orçamento local, consolidando o pretendido equilíbrio entre os poderes municipais.

Essa nova configuração transformou as câmaras municipais em espaços de representação e controle social e criou uma relação mais definitiva entre Legislativo e Executivo. Em Lençóis Paulista, essa etapa permitiu que o Legislativo atuasse de forma mais plural e ativa em momentos de muito desenvolvimento e mudanças na cidade.

Até hoje, essa fase da Câmara já soma 197 vereadores nas suas 19 legislaturas, contando os suplentes que assumiram o cargo e substituições eventuais.

 

***

 

A história da Câmara Municipal de Lençóis Paulista acompanha os ciclos políticos e institucionais do Brasil. Sua trajetória revela não apenas a evolução da administração pública local, mas também o reflexo das disputas de poder, das conquistas democráticas e das rupturas autoritárias que marcaram o país.

Cada fase vivida pela Câmara guarda episódios que evidenciam tanto os limites quanto os avanços da participação política em nível municipal. A repressão de vozes dissonantes, o controle por elites agrárias, as indicações políticas centralizadas, mas também o surgimento de novas lideranças, a inclusão de mulheres e analfabetos no processo eleitoral e o amadurecimento institucional mostram que a história do legislativo lençoense é, ao mesmo tempo, singular e representativa da experiência brasileira.

Com mais de 150 anos de existência e atravessando quatro materializações distintas, a Câmara de Lençóis Paulista é hoje um espaço consolidado de representação popular e fiscalização do poder público. Conhecer sua história é compreender a própria formação da cidade e os caminhos que, com avanços e retrocessos, moldaram a vida local.

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